Messi e o Caso dos Impostos
Na primeira semana de outubro de
2015, o Ministério Público espanhol investigou e decidiu que Messi não tinha
responsabilidade no crime de evasão de impostos, o retirando do polo passivo
da ação penal, mas mantendo Jorge Messi, seu pai. A lógica era óbvia: Messi
era jovem na época do suposto crime e nunca fez a própria contabilidade.
Seu pai, no entanto, sempre foi responsável por suas finanças, cabendo
investigar se houve ou não dolo (intenção) na sonegação de impostos.
Acontece que o direito espanhol
permite, no caso de crimes contra a ordem tributária, que a parte lesada (no
caso a Fiscalía, a Receita Federal
espanhola) faça a denúncia residualmente mesmo que o promotor do Ministério
Público tenha entendido melhor não faze-la. E foi o que aconteceu: a Advocacia
Geral da Espanha anunciou essa semana (08/10/2015) que, mesmo não participando
diretamente, Messi teria se beneficiado do esquema, razão pela qual deveria ir
a julgamento. A pena sugerida é de 22 meses e meio.
A sonegação teria ocorrido entre os
anos de 2007 e 2009, quando Messi tinha 20/22 anos. O valor total sonegado em
impostos seria de 4,1 milhões de euros.
Messi pode realmente ser preso?
Em teoria, sim. Na prática, a
chance varia entre mínima e nula. Motivos:
1) Messi nunca fez a própria
contabilidade. O argumento de que ele é coautor por ter se beneficiado
diretamente da sonegação é falacioso pelo simples motivo de estarmos falando de
4,1 milhões de euros, algo que não chega a 20% do que ele fatura mensalmente.
Quem cuida de suas finanças é sua empresa, assim como faz TODO jogador. Se
alguém pode ser acusado são seus contadores e seu pai, que supostamente cuidava
de suas finanças. Agora, se você realmente imagina Messi com uma calculadora,
planejando quais impostos ele não vai pagar para ficar um pouquinho mais rico,
você é um idiota. A boa notícia é que você não está sozinho: os responsáveis
pela Advocacia Geral da Espanha também acham – ou só querem holofotes mesmo, o
que é mais provável.
2) Acusação não quer dizer
condenação. Por mais que a mídia de massa ignore todo o processo penal e presunção
de inocência, o mero fato de alguém ser acusado não demonstra nada além da
POSSIBILIDADE de culpa. Vários outros casos similares de esportistas espanhóis
famosos (Iker Casillas e Rafael Nadal, para citar dois) já foram julgados e os
autores absolvidos, pois, assim como Messi, pagaram os impostos devidos e não
fazia o menor sentido prendê-los. É uma lógica simples: o que é mais vantagem
pros cofres públicos a longo prazo, prender o acusado que cooperou e
dificilmente se envolverá em delito similar para defender uma postura pseudomoralista
ou absolve-lo do crime e continuar arrecadando os altos impostos que ele rende
ao Estado?
3) Mesmo SE chegasse ao ponto de
Messi ser condenado, o Código Penal espanhol menciona em seu art. 80 que,
quando a pena sancionada for inferior a 24 meses (e nesse caso a pena máxima
possível é de 22,5 meses), o dano já tiver sido reparado e não houver
antecedentes criminais, a pena pode ser cumprida em sua totalidade no regime
aberto. Ou seja, mesmo se tudo der errado e Messi for condenado, não seria
preso. Mas e se o juiz mesmo assim recusasse o regime aberto? Então...
4) Os advogados de Messi apelariam
da decisão e, enquanto aguardasse julgamento do recurso, Messi permaneceria em
liberdade. A decisão ainda muito provavelmente seria reformada em grau de
apelação.
Em resumo: existe a chance de Messi
ser preso? Existe, mas é quase nula.
O que vai acontecer então?
Messi será chamado a depor e
explicará ao juiz exatamente a mesma coisa que já explicou ao promotor do
Ministério Público: quem cuida de suas finanças não é ele, sempre foi sua empresa
de contabilidade e seu pai. O juiz provavelmente entenderá o óbvio e absolverá
Messi. Jorge Messi, no entanto, tem boas chances de ser condenado. A boa
notícia é que os motivos anteriormente explanados também se aplicam ao caso, de
forma que ele dificilmente cumpriria tempo de prisão.
Em resumo: tudo isso provavelmente será uma grande perda de
tempo e uma chateação para Messi e sua família, mas não deve ter grandes
consequências – além da óbvia mancha em sua reputação, que é irreparável.
Pode ser que isso afete Messi como jogador?
Dificilmente. Estamos falando do melhor jogador do mundo, que provavelmente tem
uma ótima equipe de advogados cuidando do caso. Ele será orientado da quase
nula chance de condenação de qualquer um dos dois. A situação é chata e
afetaria qualquer um no âmbito pessoal, mas algo me diz que Messi vai ficar
ainda mais motivado para mostrar em campo que não é nos tribunais que vão
derrubá-lo. Isso envolve interesse de muita gente que não consegue pará-lo em
campo e precisa recorrer a outros meios.
Curiosidade: a diretora de serviços jurídicos da Advocacia Geral
da Espanha é Marta Silva, coincidentemente uma ex membra da diretoria do Real
Madrid entre 2004 e 2006 – gestão que na época era do mesmo presidente atual:
Florentino Pérez. Também por coincidência, claro, Marta Silva representa a
Agência Tributária Espanhola no caso Neymar sobre a suposta evasão de impostos
em sua transferência do Santos ao Barcelona. Pode, de fato, ser tudo uma grande
coincidência, mas vale a reflexão.
Fontes/jornalistas consultados:
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